Anita Berber

Nascimento: 10 de junho de 1899, em Leipzig, Alemanha.
Morte:
10 de novembro de 1928, em Kreuzberg, Alemanha.

Anita Berber foi uma das artistas mais intrigantes e fascinantes da Alemanha “expressionista”. Dançarina e atriz, teve sua vida artística afetada pelo deleite e intensidade com que levava a vida pessoal, transformando-se no espelho da decadência da República de Weimar nos anos 1920. Faleceu aos 29 anos, vítima de Tuberculose. Inclinada à dança desde criança, estudou no instituto Jacques-Delcroze. Logo que iniciou na dança profissional, Berber tornou-se uma grande estrela. Impactava a todos com o estilo transgressor, rompia paradigmas e fascinava o público, gerando grandes controvérsias por onde passava. Dona de um erotismo intensivo, incluía temáticas fortes e até mesmo obscuras, inspiradas em dilemas pessoais, como o vício em drogas. Anita teve um papel histórico na dança moderna e na arte, devendo-se destacar a importância da cabareta para uma mudança cultural em favor da independência das mulheres.

 

Pesquisa realizada por: Lohrana Canedo (Discente de Teatro da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO)

 

Galeria de fotos:

 

Links de Vídeos:

https://www.youtube.com/watch?v=tNXhthaG5nY

https://www.youtube.com/watch?v=A0D4fHieW8o&t=104s

 

Mais sobre sua biografia: 

Anita Berber era filha de Felix Berber (primeiro violinista da Orquestra Municipal) e de Lucie Berber (atriz e cantora que seguiu rumo aos palcos do cabaré considerado o “Chat Noir” de Berlim, de Rudolph Nelson). Nascida em 10 de junho de 1899, em Leipzig, Alemanha, foi criada pela avó em Dresden, pois os pais se divorciaram um ano após o nascimento de Anita e a mãe partiu quatro anos mais tarde em busca da carreira artística.

Boa parte da educação aconteceu no então recém-criado Instituto Jaques-Dalcroze, em Hellerau. Nesta escola utilizava-se um experimento utópico progressista, no qual era exaltado um princípio de harmonia natural entre o trabalho e a vida cotidiana. Era aplicado um método no ensino musical conhecido como “Euritmia”, que consiste em se concentrar em permitir que o aluno ganhe consciência física e experiência de música através de treinamento que ocorre através de todos os sentidos, particularmente cinestésico. Ensina conceitos de ritmo, estrutura e expressão musical usando o movimento. Pode-se notar essa influência no estilo de Anita Berber, cujos passos de dança eram incrivelmente sensitivos e expressionistas.

Aos 14 anos, voltou a morar com a mãe, agora em Weimar. Iniciou estudos em francês e confeitaria em um internato feminino de alto custo. Logo em seguida eclodiu a Primeira Guerra Mundial. Em 1915, Anita e Lucie se mudaram para Zähringer Strasse, no distrito de Wilmersdorf, em Berlim. Ali, iniciou aulas de teatro e foi descoberta pela coreógrafa vanguardista Rita Sacchetto. Em fevereiro 1916, Anita Berber estreou em uma trupe de dança ao lado da jovem e performática Valeska Gert. A estrela Anita Berber estava em ascensão. Além de excursionar pela Alemanha e Áustria com a Sacchetto Troupe, ela também se apresentou sozinha no Berlin Wintergarten. Nesta época também há registros do trabalho como modelo, no qual posava para revistas como Die Dame (A Dama) e Elegant Welte (Elegant World).

O estilo de Berber – como já mencionado, fortemente influenciado pela Euritmia –, incorporava a sensibilidade expressionista e a fundia com um dinamismo admirável e uma intensa sexualidade. A imprensa começou a saudar Anita Berber como a “nova maravilha na arte da dança”.

No ano de 1918, Anita estrelou o primeiro dos nove filmes mudos que faria. É válido destacar os vários trabalhos com Richard Oswald, diretor e produtor, tal qual o filme “Diferente de outros” (Anders als die Andern, 1919), que foi registrado como um dos primeiros filmes da história a tratar da temática da homossexualidade. Mencione-se o Eerie Tales (1919), um filme de mistério que foi muito bem-sucedido na época. Além disso, embora pequena, também é notável a participação de Berber no filme Dr. Mabuse (1922) de Fritz Lang, gravado no auge do expressionismo alemão.

Anita Berber era escandalosamente andrógina. Usava uma maquiagem pesada que nas fotos e filmes em preto e branco fazem parecer que ela usava carvão nos olhos e nos finos lábios (que pintava somente no meio). Cercada de tanto glamour e sucesso, o espírito livre e personalidade forte de Anita Berber ganhavam cada vez mais espaço em seu comportamento. Foi em meio a essa época de grandes conquistas artísticas que em uma festa pós-show em um hotel de Viena, Anita, bêbada, dançou nua em público pela primeira vez (1919).

Foi também em 1919 que, com a intenção de alcançar independência e sair definitivamente de casa, casou-se por interesse com um homem rico e de alta classe chamado Eberhard von Nathusius, que também era roteirista. Foi nesta época a gravação de “Diferente dos outros”, filme mencionado acima. Contudo, o casamento não cerceou a dançarina de ter várias aventuras extraconjugais, seja com homens ou mulheres, tal qual Susi Wanoswsky, proprietária de um clube de lésbicas em Berlim. A vida pessoal começava a sair do controle. As notícias de envolvimento lésbico e sexo logo partiram da turnê que ela fazia em Viena e chegaram aos jornais diários da cidade.

O retorno à Berlim aconteceu no inverno de 1919. Anita hospedou-se em uma suíte do Adlon Hotel e começou a gastar de forma descontrolada em peles, joias, sapatos e drogas. Registra-se daí sua entrega à cocaína e todos os tipos de narcóticos ilícitos de toda a Europa. Além da cocaína, também eram consumidos o ópio e a morfina. Porém, a forma preferida de entorpecimento de Anita foi o clorofórmio e o éter, que eram colocados em uma tigela e misturados por uma rosa branca, cujas pétalas eram comidas em seguida.

Durante as turnês, Berber passava as noites pelos hotéis e restaurantes elegantes da cidade. Abusando de todo o atrevimento que compunha sua personalidade, Anita vestia apenas um casaco de zibelina e perambulava pelos salões com o macaco de estimação pendurado no pescoço e um broche antigo cheio de cocaína (artefato que era utilizado por Freud para induzir à hipnose). A nudez completa e androginia em aparições públicas derrubaram tabus e dividiam opiniões. Anita expôs de maneira excêntrica e maravilhosa (de certa forma até mesmo agressiva) a beleza e diversidade da natureza humana.

A carreira no Cabaré crescia e florescia, ascendendo juntamente a reputação. Berber fazia apresentações regulares no palco itinerário “Schall und Rauch”, de Max Rheinhardt. A carreira cinematográfica não era condizente ao comportamento transgressor, mas ela era obrigada a trabalhar para sustentar o vício em drogas e álcool.

O casamento desmoronou de vez em 1921. Diante disso, Anita se tornou amante de Susi Wanowiski (a dona de um clube lésbico, já mencionada). Esta passou a ser agente e secretária da dançarina. A carreira com o Cabaré e as aparições em filmes continuaram inabaláveis (ela fazia shows noturnos no pequeno cabaré Weisse Maus, na Friedrichstrasse).

Em julho de 1922, houve o acontecimento que seria um dos mais importantes marcos na vida de Anita Berber. Em uma noite peculiarmente selvagem em um cassino de Berlim, conheceu Sebastian Droste. O magnetismo entre os dois agiu imediatamente, resultando em uma aliança incrivelmente impactante e transgressora, temperada com a sexualidade exacerbada de ambos e uma pitada do macabro que rondava o estilo de vida entorpecido e desajustado que levavam.

Casaram-se primeiro nos palcos. Estavam certos quando se convenceram de que criariam algo ousado e chocante. Começaram então a ensaiar com tanto fervor quanto consumiam cocaína. Droste ocupou o lugar de agente da futura esposa e ainda em 1922 iniciaram as apresentações da impactante produção “As Danças de Depravação, Horror e Ecstasy”, que foram marcadas para Viena, em novembro daquele ano. O número foi criado em menos de 05 meses e misturava a arte de Berber a novos materiais introduzidos por Droste. A dança era feita em dupla e algumas peças em solo. Também foi produzido um livro com o mesmo título, que só foi publicado no ano seguinte.

Pouco tempo depois, os abusos começaram a cobrar um preço. Anita registrou-se em um sanatório em Viena, devido ao consumo excessivo de drogas e álcool. Em contrapartida, o filme que havia gravado mais recentemente (Lucrezia Borgia, com Richard Oswald) foi lançado em outubro do mesmo ano, desencadeando em uma turnê de sucesso de duas semanas que levou Anita e Sebastian para a Itália, Espanha e França, abrindo em seguida uma temporada com a produção de dança em novembro, em Viena.

Os escândalos, no entanto, não paravam. Droste foi preso por tentar pagar parcialmente as dívidas que havia feito junto a Anita utilizando uma nota de crédito falsificada no valor de 50 milhões de coroas. Pode-se considerar uma sorte os credores terem convencido o Tribunal de que seria melhor deixar Sebastian Droste solto para trabalhar e pagar o prejuízo. Porém, o “empresário artístico” assinou três contratos “exclusivos” com diferentes salas de teatros. A seguir, mesmo um destes tendo conseguido ganhar a almejada exclusividade, o casal também quebrou o que tinha sido acordado. Tal atitude desencadeou no envolvimento do Sindicato Internacional de Atores, que proibiu o dois de se apresentar em qualquer lugar do continente por dois anos. Até o final daquele ano, Anita violou a proibição inúmeras vezes e foi expulsa de Viena.

O relacionamento pessoal e artístico estava abalado. Os escândalos alcançaram toda a Alemanha e a Áustria. Agora eles tinham muitos vícios para manter, porém pouco espaço e oportunidade de trabalho. Casaram-se em janeiro de 1923 e em março do mesmo ano realizaram uma turnê noturna que durou 05 meses pela Iugoslávia e Itália. Retornaram para Berlim em setembro e em outubro de 1923, Sebastian Droste roubou tudo que conseguiu carregar, dentre joias e peles de Berber, vendeu todas essas coisas e retornou para Nova York. O casamento durou 10 meses. O fim conturbado era o esperado para uma relação tão intensa, recheada de nuances de agressividade e fervor.

Por óbvio, o furacão Anita Berber se reergueu e começou a trabalhar novamente. Formou a “Trupe Anita Berber” e se apresentava em várias casas noturnas de Berlim. Porém, também já era de se imaginar que mais uma vez a volatilidade de Berber resultasse em mais demissões e proibições.

Em agosto de 1924, assistiu a uma apresentação de Henri Chatin-Hoffman, em Blüthne-Saal, em Berlim. Ele era um dançarino norte-americano, também homossexual. Anita se apaixonou pelo dançarino e o casamento aconteceu duas semanas depois. Henri ajudou a reativar a carreira de Anita. Foram compostos shows com uma mistura dos melhores números antigos, como “Morphine”, juntamente a um novo material (a música foi especialmente composta para ela por Mischa Spoliansky).

Havia o trabalho regular nos Cabarés “Rampe”, “Schall und Runch” e “Café Grössenwahn”, mas isso não impediu a estreia do primeiro espetáculo com a colaboração do novo marido. Era “Shipwrecked”, que foi apresentado em Stuttgart, em abril de 1925. No mês de outubro, foi iniciada uma turnê nacional. Quando estavam em Düsseldorf, Otto Dix imortalizou a imagem da cabareta no retrato que se tornou icônico. “The Dancer Anita Berber”. O pintor retratou Anita com um ar muito mais velho, demonstrando reflexos da vida cheia de excessos que a dançarina levava.

Anita e Henri também saíram em turnê em 1926, agora com a produção denominada “Dances of Sex and Ecstasy”. Durante a passagem por Zagreb, Anita proferiu insultos públicos ao rei da Iugoslávia. Esta atitude resultou em 06 semanas de prisão. Voltando a Berlim, o casal estava falido. Então, Anita retornou ao circuito dos Cabarés. Em outubro saíram em turnê pela Holanda, estando longe de Berlim por quase dois anos. Após, passaram pelo Oriente Médio, iniciando as apresentações em Atenas, seguindo pelo Cairo, Beirute e Damasco. Henry não poupava esforços em tentar convencer Anita a abandonar o álcool.

Em julho de 1928, em Beirute, na Síria, Anita desmaiou durante uma apresentação e foi diagnosticada com Tuberculose avançada. Ela desejou desesperadamente voltar para a casa. A viagem foi exaustivamente longa e cansativa, precisando-se fazer paradas de tempos em tempos para que Anita se recuperasse em cada etapa. Todo o dinheiro havia sido sugado pelos custos com transportes. Enquanto isso, em Berlim, os amigos dos Cabarés se juntaram para patrocinar os últimos estágios da viagem. Chegando em Berlim, Anita foi levada Hospital Bethanien em Kreuzberg. Quatro meses depois, aos 29 anos, em 10 de novembro de 1928, Anita Berber faleceu e foi enterrada em um túmulo de indigentes em St. Thomas Friedhof, em Neuköln. Atualmente o cemitério está inutilizado e não se tem certeza de onde está o túmulo, havendo apenas leves indícios da localização.

Os obituários dos jornais foram elogiosos. Contudo, pouco tempo depois, foi-se perdendo o interesse fora dos círculos de história da dança. Em 1996, Lothar Fishers escreveu um livro que ajudou a “ressussitá-la” (1918-1928 em Berlim) e Rosa von Praunheim lançou um filme sobre a arte da dançarina em 1987, chamado “Anita – Tänze des Lasters”, que ajudou a elevar o status da cabareta como fortalecimento da luta feminista e quebrou tabus sensacionalistas. Destaque-se também o livro “Os sete vícios e as cinco profissões de Anita Berber: A Sacerdotisa da Decadência de Weimar Berlim” (2006).

Referências Bibliográficas:

Anita Berber (1899-1928): Baile y erotismo en Weimar-Berlín. Mujeres Riot.  Disponível em: <http://mujeres-riot.webcindario.com/Anita_Berber.htm&gt;. Acesso em 23 abr. 2018.

Anita Berber, Sebastian Droste and The Dances of Vice, Horror and Ecstasy. Side Real Press Extras. Inglaterra. 2016. Disponível em: <http://siderealpressxtras.blogspot.com.br/2012/06/anita-berber-sebastian-droste-and.html&gt;. Acesso em: 24 abr. 2018.

Anita Berber. Wikipedia. 09 abr. 2018. Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Anita_Berber&gt;. Acesso em 23 abr. 2018.

ARAÚJO, Laércio Lopes de. Um ídolo! Anita Berber. 04 nov. 2012. Disponível em: < http://drlaercioaraujo.blogspot.com.br/2012/04/um-idolo-anita-berber.html&gt;. Acesso em 23 abr. 2018.

BRENDAN. Anita Berber. Cabaret Berlin. 24 set. 2010. Disponível em: <http://www.cabaret-berlin.com/?p=365&gt;. Acesso em 23 abr. 2018.